«As rosas que colhi na estrada apagaram-se no meu quarto porque a música que as mantinha presas à vida, sem água nem terra, parou. E pedem-me com sono a loucura para que as desperte, mas estou muito acordada, há tempo de mais dentro de mim, horas a mais porque o dia se prolongou e não acaba.
Ando a dar horas extra para que me paguem ordenados mais pequenos mas
eles insistem em encher-me os bolsos que estão rotos e perdem tudo e mesmo com
o tempo todo ainda não cresci e quando crescer não quero ter uma empresa, quero
trabalhar sozinha num jardim a transformar com pincéis as rosas em azul para
fazerem de céu e terem sempre água em vapor no meu quarto e não se apagarem.
E a loucura, faz-me triste e alegre em dias alternados e hoje os dias
alternados estão misturados e tenho um dia par e um dia ímpar a fazer de
camisa-de-forças para não me mexer muito e esperar que o sono chegue como quem
espera por um beijo quente.
E, enquanto as rosas não crescem, vou freneticamente, lunaticamente,
colhe-las para o meu quarto, sem jarra e despir a camisa e pintar o peito com o
azul que não consigo pintar nas rosas (teimam no cor de rosa) e fazer
buraquinhos minúsculos nos dedos com as folhas como quem lê em braille, cega
porque não há água no meu quarto, cega porque não há terra no meu quarto, cega
porque já tenho sono, tenho muito sono e os olhos não fecham, não fecham e as
rosas apagaram-se porque a música parou quando fiquei com os bolsos vazios.
E a camisa não sai por isso vou continuar à espera do beijo. O azul é
impossível de pintar nas rosas. Mas vou inventar um azul para as minhas. Tenho
o tempo todo e todo é pouco para criar azul, todo é pouco para esperar. E a
camisa és tu. Mergulhei na loucura e descobri que foi lá que te encontrei:
prende-me, para não me mexer muito e dá-me um beijo… azul».
21/05/2013
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